quarta-feira, 29 de julho de 2009

Sobre crianças, aeroportos e esperas

Os aeroportos são lugares cheios de histórias, talvez pelo tempo de espera, pela permanência forçada. Há rostos cansados, mãos pesadas e pés apressados. Porém, há um ar de esperança, de chegadas e partidas necessárias, inevitáveis.

As pessoas na porta de saída do desembarque não tiram os olhos do horário/situação dos vôos e se aglomeram na faixa de contenção. Alguns disfarçam a ansiedade, compram jornais e folheiam revistas - como se fizessem leitura dinâmica. Um olho nas letras, outro na porta que, quando se abre, cria uma expectativa imensa. As crianças brincam de passar por debaixo das faixas de contenção enquanto os adultos resmungam e esperam.

Da última vez que estive no aeroporto de Goiânia, no meio de toda a tensão da espera, saiu do portão de desembarque uma moça da limpeza, com uma vassoura e panos de chão. A decepção nos olhos de alguns era visível, quase pude ouvir ao fundo um ‘ahhh’ em coro.

Eu era apenas mais uma dentre tantas pessoas que se aglomeravam à espera de um desembarque. Com a chegada de um vôo vindo de Congonhas, uma mulher com três malas empilhadas em um carrinho de bagagem cruzou o portão. Uma outra senhora abraçou uma menininha de uns 4 ou 5 anos:

- Olha, é a mamãe!... Disse apontando a moça quase escondida atrás das malas.

A criança correu ao encontro da mãe, que, por sua vez, se abaixou e abriu os braços. Porém, a menina abraçou a mala e disse em alto e bom tom:

-Mamãe, a barbie está aqui dentro?

A mãe sorriu desconcertada e, puxando a filha pelo bracinho, abraçou a criança. Definitivamente, as crianças têm um jeito particular de encarar as chegadas e partidas. Quisera os adultos encarar tudo isso com tanta naturalidade.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Desconhecidos familiares

O caminho para o trabalho é feito no meu carro. Tenho um remoto controle do que vejo enquadrado pelas minhas janelas. Entre outdoors descascados e placas de sinalização, encontro os mesmos rostos desconhecidos, porém familiares.

Com certa freqüência, encontro, na esquina de minha casa, um senhor de cabeça branca e mãos enrugadas, porém firmes. Ele segue seu caminho em uma mobilete barulhenta. Não sei qual é o destino do motociclista, mas gosto da vida que salta de seus olhos.

Outros personagens encontro no vermelho dos sinaleiros: o casal que vende mel, com tiras imensas da mercadoria nos ombros, sempre simpáticos, sempre sorrindo. Há também o bêbado que pede dinheiro para voltar para casa. Todos os dias ele é assaltado nas proximidades de um hipermercado.

Na avenida Independência está o senhor que ganha um trocado como estátua viva. Ele reveza: há dias em que é de bronze, noutros prata, em alguns de barro e nos últimos dias: Michael Jackson. A maquiagem branca, a luva e os óculos espelhados fazem do rei do pop o seu sustento.

Logo cedo, cruzo com Joões, Raimundos, Josés e Pedros: catadores de papel que se reúnem atrás de um centro de moda atacadista da cidade. Alguns levam a família em seus carrinhos, filhos empoleirados em castelos de papelão e sucata.

São esses personagens que me acordam, é para eles o meu “bom dia” e “boa tarde”. É para eles o meu primeiro sorriso, mesmo nos dias em que os dias não amanhecem bem. São eles que me chacoalham e tiram a poeira das retinas, são esses rostos desconhecidos, assim tão familiares, que me mostram que a vida, lá fora, continua, mesmo quando a gente decide reclamar com a boca cheia.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Madrugadas, chás e confissões

As janelas se apagam lá fora. O chá esfriando na caneca me traz as noites frias passadas a dois, junto a um filme repetido na televisão. São pequenas coisas que não foram embora, são pedaços de uma história ainda viva, construída pouco a pouco e que agora flerta com uma saudade dolorida. Há fotos sorridentes pelo quarto, perfume nos travesseiros.

Há você em toda a parte, na rua, nos meus discos, letras e cafés. Gosto da maneira como pede um espresso simples, ou até mesmo um duplo, com cara de quem vai ganhar o mundo. E eu, aqui, tomo o meu chá, calada, e peço todas as lembranças boas ao alcance da xícara.

Eu tenho vontade de ligar só para falar do filme repetido, do texto que não fiz, do acontecido na rua, pra dizer apenas oi. Rabisco um texto. Jogo fora: Deixo o destino dizer por si, sem precipitar ou julgar. Caminho devagar e as janelas se apagam lá fora. A luz do meu quarto continua acesa. O sono só vem em doses cavalares, ou nem aparece e, por isso, continuo contando as janelas, em trios, se apagarem. Fico a dizer essas coisas, assim, sem rumo.

Sinto saudades de você me contando os episódios da série favorita, antes mesmo de eu assistir. Agora não há ninguém que sabe a hora de tampar meus olhos para eu não ver o sangue de mentira na tv. Porque é só você que entende essas minhas loucuras e meu estômago fraco. É só você que assiste ao meu lado aos filmes que ninguém mais quer ver. É só você que compartilha os momentos, todos.

Saudade da forma como você desconversa quando quer o silêncio; da forma como abraça quando precisa de atenção. Gosto de todas as novidades, da rotina sempre reconfigurada, da sua paz. Lá fora, a madrugada já é alta, já perdi a noção do tempo e perco meus próprios pés ao procurar os seus. As luzes se apagam, mas não apagam os caminhos.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

O final de qualquer espera

O que fazer quando uma espera acaba? Seja o resultado bom ou ruim, ficamos sempre sem espaço para as mãos, uma lágrima entre o triste e o feliz, uma partida para depois que parte agora, mas não parte nunca. O que fazer com o que se sente quando uma espera acaba?

São coisas novas, passos novos, sonhos largos. São percalços, saudades, tudo misturado, condensado e explosivo. É preciso respirar fundo, gastar as pontas, construir as pontes, rasgar os medos, mantendo apenas cautela e paz de espírito.

Ao final de qualquer espera, é preciso entender que é necessário comemorar sempre, pra viver em paz. Pra saber a hora do silêncio e do grito; a hora da lágrima, do riso e do misturado. É preciso comemorar mais, comemorar sempre.

Quando a espera acaba, é hora do abraço largo e deixar as horas de outras esperas para mais tarde. É o momento para entender que o mundo vem em tempestades, mas devemos conduzi-lo em conta-gotas.

(Leia aqui sobre o tempo de uma espera)